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060 – Agressividade X Violência – Politicamente Correto e Floco de Neve

Autor: Vicente do Prado Tolezano 03/12/2019

A filosofia de boteco, por vezes, acerta em cheio. Ela diz com muita correção que “uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa”, intuição própria dos princípios lógico e ontológico da identidade.

Assim, de ver que “violência” é violência e “agressividade” é agressividade, sem que um seja seis e o outra apenas meia-dúzia. A confusão semântica é bastante danosa, particularmente em contextos tomados pela chaga miopizante do “politicamente correto”.

“Violência” vem de violação/transgressão/cruzamento da fronteira do proibido. É fazer o que é errado. Violência sempre é inaceitável, sem possibilidade de concessão. Aliás, pode se ter como sinônimos “violência” = “ao que não é possível de conceder”.

“Agressividade” vem de azedo/arisco/áspero/hostil/atritivo. É colidir, destruir, repelir, etc… à fórceps e sob as vistas. Há agressividade tanto justa quanto injusta. Há inclusive deveres de agredir.

É evidente que agressividade injusta é violência, mas sem confusão entre os conceitos em si, até porque há muita violência-não-agressiva (inclusive as piores delas são até “dóceis”) e porque parte da agressividade ocorre no território não apenas do “meramente tolerável”, mas mesmo do obrigatório.

Ao uso adequado da força agressiva contra objeto certo, forma e proporcionalidade adequadas, se dá o nome de “virilidade” ou “coragem”, categorias de ação. À omissão ou inépcia da capacidade de bem agredir se dá o nome de “covardia”, categoria de paixão.

Não é só “coisa de néscio” não discernir uma coisa da outra, é manifestação de nihilismo cínico e mesmo um ato de violência inculcar inibição à atuação puramente natural da agressividade quando pertinente. É um esquema violento deixar as pessoas passivas (até para ser violadas!), pois é próprio do humano desenvolvido o princípio de ação.

Maria Montessori (1.870 – 1.952) foi certeira no particular: “a primeira ideia que uma criança precisa ter é a da diferença entre o bem e o mal. E a principal função do educador é cuidar para que ela não confunda o bem com a passividade e o mal com a atividade”.

O solo afetivo da agressividade é a ira e o da violência é o ódio. Fossem moedas, a outra face inseparável da ira seria a vontade e a do ódio seria a inveja.

Ira é eco sentimental de incômodo por alguma “situação de desarmonia” ou por alguma falta que melhor harmonizasse nalgum contexto. É impulso de largada para a vontade reparar/ajustar/propor e outorga senso de potência e afirmação da personalidade. Uma pessoa voluntariosa é iracunda.

A vontade do iracundo (pleonasmo para ênfase) faz fronteira com a posição/reposição da harmonia crida. Atente-se que rancor ou espírito de rixa são degenerações da ira porque estão num lusco fusco de atenção que sai da “situação” e vai para os “outros”.

A ira bem dirigida, bem elaborada é etapa do fluxo ao nosso desenvolvimento vital e volitivo e que nos permite – e nos exige – valer da agressividade em casos justificados de defesas legítimas (da vida, bens morais ou materiais).

A falta da ira implica angustiante abatimento vital, e depressão inclusive, por sujeição passiva às circunstâncias. Não crer na capacidade de ira própria ou pensar-se tolhido de ser agressivo diante de hostilidades injustas, martela um sentimento de vida não vivida em nosso interior como se dá ante a frustrações de tudo o que é natural mesmo e passa a ser uma “violência contra si”. A rigor, esse é o esquema psíquico do masoquista.

Ser agressivo quando se deve ser é expressão de força não só material, mas existencial. Sê-lo quando não é o caso ou o ser desajustadamente, a mais de possível violência, é ato de fraqueza. O ódio é a expressão externa da inveja e não se associa com incômodo com desarmonia, mas com o oposto, a harmonia/sucesso/felicidade/valor do “outro”.

O invejoso sofre não porque alguém lhe tenha feito algum mal (o que seria próprio da ira), mas só pelo fato de alguém ter sucesso, alegria, riqueza, independência, etc … Sente-se existencialmente afrontado sem um nexo causal direto contra, mas projetivo contra o outro e por causa do outro. A gravidade é evidente, pois não busca sequer uma “harmonização” de uma situação, mas uma “destruição”.

Exemplifiquemos com invocação de Antoine de Saint-Exupéry (1.900 – 1944) que no seu clássico: “O Pequeno Príncipe”, atentava que não se deve ter ojeriza a todas as rosas (caso de ódio) por uma que o feriu com seu espinho (eventual caso de ira).

As rosas, logo elas que são as mais belas flores, são o “outro” que não pode existir. O espinho de uma delas é só subterfúgio. O “outro” pode ser coletivo ou individual. O odioso/invejoso não busca podar espinhos (coisa que um iracundo poderia fazer), mas destruir o odiado/invejado, porque ele é como ele é.

Está aí a cepa da violência em sentido estrito. Incomodar-se com o outro pelo que o outro é consigo ou por si sempre, é violação da ordem do ser. O ódio será a materialização destrutiva decorrente desse incômodo, que poderá se dar até por meio de agressividade injusta, no sentido de colisão atritiva explícita ou por meios ardilosos de difamação, enganadores, simbólicos, etc…

Repetimos que a violência nunca é aceitável, pouco importando se ela é agressiva ou não. É sempre insana e é um problema de constituição da pessoa invejosa. Noutros artigos, vamos investigar a psicogênese da inveja.

A ira nasce por conta de algo de fora. O ódio nasce por conta de algo de dentro e a situação externa é só subterfúgio, tal que se não fosse a rosa, o odioso acharia outra “bola da vez”, preferencialmente entre aqueles que não tem capacidade de ira. Outro meio de separar ira de ódio é que o iracundo segue adiante após os seus atritos e o odioso estaciona sua vida em relação ao odiado, pois num sentido o odioso “não sai de si”.

Muitas vezes, a violência ela é difícil de ser discernida e pode estar no meio de baús de ternuras. Por exemplo, pais que, até inconscientemente, invejam filhos por causa do sucesso/liberdade deles (efetivos ou só possíveis) existem em número expressivo. Violam-nos em esquemas castradores para que não vivam a vida na plenitude. Essa, aliás, é das maiores violências possíveis.

Não raro, urge inteligência fina para entender a violência, pois pode ser metasensível. Idem para judicar se a agressividade é justa ou injusta (violenta).

Gente inteligente consegue captar que o “politicamente correto” é, no mais das vezes, violência que ecoa no mundo da inveja, inveja da força e liberdade alheias e seu meio é a censura acrítica-cínica à agressividade/virilidade/iniciativa, etc… é para fazer que os outros vivam vidas menores ou meramente passivas.

O fruto que a violenta árvore do politicamente correto já deu é a chamada “geração floco de neve”, composta pelos incapazes de ira – os hipersensíveis acovardados, coitadistas e impotentes, próprios da camada 4 – e pelos capazes só de ira meramente fingida – os arrogantes, rebeldes sem causa e também impotentes, próprios da camada 5.

 

A reprodução do texto é livre, devendo ser citada a fonte e preservada a unidade do pensamento.

Vicente do Prado Tolezano é graduado em direito peça PUC/SP e Mestre em Filosofia pela Faculdade do Mosteiro de São Bento de São Paulo, com investigação sobre a Metafísica de Aristóteles. É diretor da Casa da Crítica e da Tolezano Advogados.

Tem formações complementares diversas na área da Gestão, Psicanálise, Mediação, Filosofia Clinica, Lógica e Argumentação e outras sobre a Alma Humana.

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