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035 – Amor, Verdade, (in) tolerância, perdão e fanatismo

Autor: Vicente do Prado Tolezano 11-07-2018

Entre as poucas regras quase desprovidas de exceção, está aquela que dita que “aquele que não ama, está sempre fingindo que ama, ainda que contra todas as evidências ululantes”.

O AMOR é extremamente OBJETIVO e até porque, em acurado rigor, AMAR é, acima de tudo, tal como uma conditio sinequa non, AMAR A VERDADE. Ou seja, a “subjetividade” é coisa muito limitada aos amorosos.

Não há nenhum exagero em se dizer que amar consiste justa e exatamente em NÃO MENTIR, quer seja sobre fatos, situações, valores, impressões, intenções e, acima de tudo, NÃO MENTIR sobre SI, tanto para consigo quanto para OUTREM no sentido de NÃO SE PERMITIR IDENTIDADE FANTASIOSA, aquela coisa vulgarmente chamada de EGO/PERSONA.

Toda pessoa EGOÍSTA é criadora de uma fantasia IDENTITÁRIA e, também cria pseudo arranjos de mundo conforme suas fantasias, ou seja, é NEGACIONISTA.

Quanto menos EGOÍSTA uma pessoa é, mas ACEITADORA da realidade alguém é. O nome que se dá à qualidade de ter espírito de abertura ao real é HUMILDADE.

O repertório de variações de opções de ação ao AMOROSO sempre é pequeno, pois é próprio de todos os sensos de VERDADE a tendência à “universalização redutora”. Ao passo que ao EGOÍSTA se dá o oposto, já que as MENTIRA ou SUBTERFÚGIOS tendem à propriedade da “particularização multiplicadora”.

O ululante é que a verdade é uma e é de todos e a mentira é de cada um, senão até mesmo várias mentiras para cada um!

O ponto nodal deste artigo reside na questão da (IN) TOLERÂNCIA própria do AMOROSO, o que, pelo já exposto até aqui, fica claro que há de ser, obviamente, “bastante restrita”.

Com efeito, ser amoroso/bondoso/caridoso/honesto/franco implica, num sentido, ser muito INTOLERANTE e, pois, muito estraga-prazeres, antipático, antissocial, desconfortante, etc… pois, a rigor, o AMOROSO não têm vínculos nem interesses para com o AMADO, senão de que este é apenas um “BENEFICIÁRIO” daquele e tal que está LIVRE dos vícios de bajulação.

Necessariamente, os vínculos do AMOROSO são espirituais-verticais e, como já adiantado, pouco interessa propriamente o amado, no sentido de lhe “agradar”.

Nem poderia ser diferente, pois assumido que o próprio miolo do pão do amor é a noção de VERDADE, a qual é igualmente TRANSCENDENTAL/METAFÍSICA, logo tem vistas para além de qualquer conveniência ou mesmo convenção.

Veja que se houver bondade, doação, sacrifício, etc… em (suposto) favor do amado, mas houver excessiva ocupação em quem o amado efetivamente é, no sentido de o esforço do doador depende bastante de qual exata pessoa se cuida, a hipótese de que INEXISTA propriamente amor, mas sim que exista apenas “EGO EXPANDIDO” é muito prevalecente.

Isso, aliás, é muito comum nas relações para com filhos, com o tipo de egoísta que “odeia crianças”, mas que diz e parece amar o “filho próprio”. Esse terreno fica muito fértil para patologias com frutos muito cruéis, até porque é próprio do que é sutil ser mais cruel. Noutros artigos, trataremos das “bondades ilícitas”, melhor aclarando a problemática desta digressão.

Na dimensão apenas do mundo, social-horizontal, o AMOR altruísta faz muito pouco sentido, senão, até mesmo nenhum sentido, sendo o amoroso tratado como IDIOTA, IMBECIL, etc…

A rigor, na racionalidade exclusiva e pura de mundo, o EGOÍSMO é a solução inteligente, já que provê mais defesa/apego em detrimento da força/desapego próprias do amor, ainda que as posturas de defesa sejam useiras da cosmética da força.

A noção de TOLERÂNCIA vulgarmente difundida entre nós como um valor bom, democrático, moderno, etc…, é, no mais das vezes, apenas um estoque de cosméticos aplicado sobre feiuras diversas de DESAMOR mesmo, em consonância com a premissa da partida de que “quem não ama finge que o faz”.

Ao invés de CUIDAR do viciado/fraco/mentiroso no sentido, duro/custoso/transformador, de raspar a peneira (criticar) nas impurezas do amado para buscar/avivar brilho no “subjacente”, o TOLERANTE vulgar opta por até “confirmar” o vício do viciado, seja com uma mui pseudo misericordiosa ou sentimentalista aceitação/bajulação do feioso por aquilo que nele é feio e frequentemente com um cínico RELATIVISMO do que fosse o belo/bom.

O jogo é cruel, mas é simples e tal que um viciado pede “me engana que meus vícios não são vícios” e o “tolerante” responde tal que “te mantenho no engano sim, e ambos nos enganamos reciprocamente de que não estamos a, inclusive, enganar-nos e auto enganar”.

Trocando em miúdos: um EGO mantém outro EGO reciprocamente.

Sabe o leitor um nome de tendência amplamente difundida dentro dessa TOLERÂNCIA tosca e desamorosa, simulacro de amor por pseudo aceitação: o POLITICAMENTE CORRETO, cujo nome até já é indício de insubstancialidade, já que “correção” e política (em sentido amplo) não são farinha do mesmo saco.

Sob a pluma bonita e não leve, mas leviana, da TOLERÂNCIA há espectro de covardias desde pais que deixam de impor a filhos dever de respeito, aplausos ao funk, palestras motivacionais para desvocacionados, nihilismo, esforço mirabolante de justificativa para perversões mil, de droga, de aborto, de hedonismo e por aí vai a vereda sem fim.

Quem TOLERA muito não ama nada e justamente a dita “tolerância” é ESCAPISMO do AMOR, uma tentativa de exoneração do esforço de CUIDAR de outrem com o manuseio árduo da já falada peneira e, mais ainda, também é tentativa de EXONERAÇÃO do maior desafio que o AMOR – e só ele – impõe, que é o PERDÃO.

Veja que a questão é até lógica. Quem muito tolera tem em muito baixo grau o senso e mesmo “não teria” a necessidade de PERDOAR, já que “mais ou menos” tudo vale, como é próprio das exonerações morais do relativismo.

Só que, com o perdão do trocadilho, o “mais ou menos” é muito “mais ou menos” mesmo, já que em sentido acurado o não perdão não vem de “desnecessidade”, mas mesmo de desamor relativista que tende a se converter em ÓDIO/RANCOR/IRA/VINGANÇA, etc…

Como já dissemos, só se mantém uma situação social RELATIVISTA com um pacto recíproco de engano (EGOLÁTRICO) recíproco. Isso é a farinha, fermento, ovo e tempero da atividade POLÍTICA no seu sentido amplíssimo.

E, a seu turno, POLÍTICA não permite “traição/quebra de pactos”, não obstante quão espúrios possam ser os pactos. A quebra dos pactos de EGO tem condão de “troca de personalidade”, coisa pavorosa à maioria.

Uma vez vendida a alma, o comprador não costuma “tolerar” a suspensão da entrega da mercadoria e pode bem esperar daí MUITA INTOLERÂNCIA …

Ou seja, e aqui vamos nos valer de paródia de asserto clássico de CHESTERTON para afirmar que “o relativista TOLERA/ACEITA tudo e não perdoa NADA”, sendo este “nada” a quebra do pacto de autoenganos recíprocos/cumplicidade/servilismo, etc…, ou seja, pacto político/grupal/HORIZONTAL – EGOLÁTRICO.

Doutro lado, “o AMOROSO é INTOLERANTE para com muita coisa, mas PERDOA muito quanto às transgressões ao intolerável”. Veja que o PERDÃO segue sendo a extensão do CUIDADO, do uso a posteriori da peneira filtrante/purgativa.

É raro que as impurezas sejam depuradas somente por conselhos, sem ter de refinar muitas e muitas vezes mais, quase que como um perdão a mais, um perdão a mais, um perdão a mais e assim adiante.

É próprio do amoroso não cansar de REFUTAR o vício nem cansar de ACOLHER o viciado. Ou seja, há de PERDOAR. É difícil…. são poucos os HÉRCULES!

Contudo, não se olvida que há – e quantos hão– os tipos, em especial nas adjacências religiosas, que bradam ao mesmo tempo as INTOLERÂNCIAS dos amorosos contra os desvios da realidade e as IRAS dos relativistas tolhedoras de perdão dos “irmãos desviados”. São os FANÁTICOS, gente que também não aprecia “pegar na peneira para CUIDAR concretamente de ninguém”.

A seu modo, os FANÁTICOS também buscam só confirmação egóica, nunca transcendência. Também a seu modo entendem os não aderentes como traidores.

Pode haver mudança nos temperos, mas as farinhas do fanático e do relativista são a mesma, nenhuma se dispõe mesmo a CUIDAR, para buscar um subjacente bom que esteja sob x, y ou z problema.

Queres CUIDAR de alguém sem ter de PERDOAR? Te engana, pois, que tu gostas disso e escolha entre o subterfúgio do EGO relativista ou do EGO fanático. Afinal, quem não ama sempre finge que ama, já que de verdade não gosta e isso fecha todo o circuito que começa e termina no EGO!

A reprodução do texto é livre, devendo ser citada a fonte e preservada a unidade do pensamento.

Vicente do Prado Tolezano é graduado em direito peça PUC/SP e Mestre em Filosofia pela Faculdade do Mosteiro de São Bento de São Paulo, com investigação sobre a Metafísica de Aristóteles. É diretor da Casa da Crítica e da Tolezano Advogados.

Tem formações complementares diversas na área da Gestão, Psicanálise, Mediação, Filosofia Clinica, Lógica e Argumentação e outras sobre a Alma Humana.

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