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031 – Amor, Ansiedade existencial, medo x culpa/angústia

Autor: Vicente do Prado Tolezano 05-02-2018

O paradoxo próprio da “condição humana” é a de SER SEPARADO: somos a única espécie “separada” e disso temos consciência, seja de forma clara ou difusa (até uma “consciência inconsciente”).

Sabemos que somos integrantes da natureza, particularmente da natureza animal (sem embargo de participarmos dos reinos vegetal, mineral e mesmo cósmico, pode-se dizer). Sem prejuízo dessa integração – e aí o PARADOXO – sabemos que transcendemos ao mundo meramente natural, num sentido de “para além dele”, mesmo que, num outro sentido simultaneamente presente, “estejamos nele”.

Esse paradoxo é que é SER SEPARADO, o que equivale a “ter consciência de SI”. Só nós conhecemos o “EU”, essa instância ontológica que, quando se afirma, se afirma em SEPARAÇÃO do mundo, incutindo, inexoravelmente ideia ou afeto bruto mesmo de SER DESAMPARADO ou SOLITÁRIO.

Nenhum animal tem essa CONSCIÊNCIA de separação ou desamparo, pois ele é o que efetivamente é, sem a dimensão intelectual “cogitativa” do ser.

Um cachorro sabe identificar seu dono, mas quem é o dono, no sentido de “o que é “dono”, ou mesmo o que ele (o próprio cachorro) é, isso não sabe nem disso se ocupa. Os aparelhos instintivos dos animais lhes dão (até com uso de certas faculdades de razão) tudo o que necessitam para a vida na dimensão dita “HORIZONTAL”, mas não lhes outorgam acesso à dimensão “REFLEXIVA”.

Nossos aparelhos instintivos têm a estrutura animal e mais que isso. Assim, tal como os animais têm “medo” pelos seus aparatos instintivos, nós também o temos e temos mais que isso.

Ponha um predador em frente do animal ou lhe comprometa, na luz do “horizonte sensível”, qualquer função vital, o animal fica estressado, com medo, etc… Afasta essa ameaça e o animal baixa o stress. Isso se passa conosco também.

O que o animal NÃO tem é sentimento de ANSIEDADE, exclusividade nossa. Não tem sentimento de ANSIEDADE porque ele não tem qualquer “resposta existencial” para dar: ele simplesmente vive, sem dimensão de COGITAÇÃO, tudo no domínio da definição “horizontal” apenas. Ao vácuo de cogitação se dá o nome também de INOCÊNCIA. Chame de “resposta existencial” a “vida humana” e chegará a sinônimos perfeitos entre si.

Na medida em que nossa consciência de SER SEPARADO brota, brota-nos, naturalmente, a ANSIEDADE, no caso a dita “ansiedade existencial”, presente apenas porque existimos e existimos no drama da SEPARAÇÃO da natureza e, pois, no mundo sem tudo definido, como explica uma analogia de um NÁUFRAGO EM BUSCA DE CONTINENTE.

Quer gostemos ou odiemos, quer reconheçamos ou neguemos, quer enfrentemos ou fujamos, o fato inexorável é que TODA, e absolutamente toda, a nossa vida é, única e tão somente, a “resposta” que damos ao ESTADO DE SEPARAÇÃO DA NATUREZA, como uma “pré-humanidade” que foi perdida, a qual tentamos tanto voltar quanto superar e cuja mola que não descansa de pressionar é a ANSIEDADE da existência como SER SEPARADO.

Dependendo de como “respondemos” (como “vivemos”), essa ANSIEDADE se amaina ou se intensifica. Tanto quanto mais nos fusionamos/associamos para com o mundo de menos ansiedade padecemos e quanto mais nos separamos do mundo, a ansiedade, a sua vez, ganha tônus.

O esforço fusionante/associativo para com o mundo se chama AMOR e o movimento separativo/dissociativo se chama EGOÍSMO. Exemplo de fusão amorosa: um fruto maduro, que servirá de alimento e, então, prestará à cadeia da vida as sementes reprodutivas de mais vida.

Exemplo de separação egoística: um fruto que ficasse eternamente verde ou que seja tóxico ou que seja estéril, ou seja, só bebe seiva da árvore, mas não produz valor à cadeia da vida. Altera, leitor, dos exemplos, os sujeitos “fruto” por “pessoa” que nada muda em termos de estrutura e senso de proporção.

Se a ANSIEDADE não é amainada com as respostas amorosas, ela dá à luz as filhotas gêmeas da CULPA e ANGÚSTIA e, às vezes, a filhota VERGONHA. Ou seja, o EGOÍSTA recebe o pacote completo de mãe e prole.

Os animais não padecem de CULPA, ANGÚSTIA ou VERGONHA, mas padecem de MEDO, como já falamos. Discernir emoções é muito fácil muitas vezes e muito difícil muitas vezes! Separar o MEDO das filhas da ANSIEDADE não costuma ser fácil, mas é muito importante para não “perder o recado”.

Toda emoção é um tipo de recado ou alarme de ou para as condutas vitais e os animais não precisam, à evidência, de alarme/recado para atuação em dimensão em que eles não vivem, como é a dimensão reflexiva, mas nós precisamos, pois vivemos nela também.

Não há EGOÍSTA que não receba os recados da família, completa da Sra. ANSIEDADE; o que define EGOÍSTA, pois, é o que recebe os tais recados e dá-lhes de ombros por meios múltiplos de disfarces ou couraças incluindo-se disfarces de si para si, situação que, obviamente, só salienta mais e mais a perspectiva do SER SEPARADO/DISSOCIADO, o que demanda mais disfarces e que, providos, aumenta o senso de separação, pedindo, então, mais disfarces, podendo rodar muuuuito a roda do vício negacionista da realidade.

Entre muitos outros tipos, é disfarce, inclusive auto disfarce, do EGOÍSTA que visa encobrir a não amorosidade fusionante se EXIBIR SEM MEDO, com muitas couraças nesse sentido, e jogando para uma plateia horizontal como se, supostamente, isso tivesse algum nexo na dimensão reflexiva!

Fica até uma dica para o leitor: quando alguém insistir muito explicitamente em se exibir SEM MEDO, tem alta chance de ser gente com muita CULPA e ANGÚSTIA ou VERGONHA e busca uma certa “aprovação alheia de valor” para pseudo aliviar a SENSAÇÃO DE SEPARAÇÃO/SOLIDÃO/DESAMPARO, mas… cuida de ERRO DE TRANSFERÊNCIA!

Em casos extremos, e que não são raros, a família da Sra. ANSIEDADE é pródiga em presentear com “desespero”, “depressão crônica”, “neuroses a quilo, senão em toneladas”, “pânicos”, entre outras espécies de suicídio ontológico, pois recusar recado vital é suicidar-se, ainda que pouco a pouco.

Contudo, em sentido muito próprio, não existe cicuta passiva para a ANSIEDADE, CULPA, ANGÚSTIA e VERGONHA. O que pode existir é a AÇÃO ATIVA DE AMAR, cujo sinônimo é de buscar o estreitamento da separação e sua transcendência, ÚNICA vereda que alivia e isola a pressão da mola da ansiedade, inibindo a visita da culpa, angústia e vergonha. Lembre do movimento ASSOCIATIVO/FUSIONANTE do fruto!

A quem não gostar de que a vida humana é serva do Mandamento Universal do Amor, a única alternativa é se iludir que assim não fosse, mesmo sabendo que é. Obviamente, não por que alguém se iluda em bastar-se separado/dissociado que a conta não vem, tal como que não adianta pôr couraça de coragem, pois a questão, como dito, não é de medo.

Amar, como enfatiza o ERIC FROMM, é a ÚNICA RESPOSTA EXISTENCIAL MADURA e, diz este articulista, é a única que poderá pôr o Rivotril no seu devido lugar, que é servir a doentes orgânicos no sentido próprio e não aos doentes de alma como os náufragos que querem negar o continente ou negar-se de a ele nadar.

Quem não conhece multidões de náufragos/egoístas/desamparados dando braçadas a esmo e exibindo falta de medo de sua estupidez existencial?

A reprodução do texto é livre, devendo ser citada a fonte e preservada a unidade do pensamento.

Vicente do Prado Tolezano é graduado em direito peça PUC/SP e Mestre em Filosofia pela Faculdade do Mosteiro de São Bento de São Paulo, com investigação sobre a Metafísica de Aristóteles. É diretor da Casa da Crítica e da Tolezano Advogados.

Tem formações complementares diversas na área da Gestão, Psicanálise, Mediação, Filosofia Clinica, Lógica e Argumentação e outras sobre a Alma Humana.

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