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Autor: Vicente do Prado Tolezano
28-03-2017

Quem não terá amiúde ouvido que “AS ESCOLAS NÃO EDUCAM!”, tal como um desabafo ou indignação reiterada ad infinitum?

A rigor, a afirmação não deveria decorrer de uma constatação da realidade, mas sim, das próprias definições conceituais, tal que é uma TAUTOLOGIA lógica, já que nenhuma escola educa mesmo, já que escolas não têm essa finalidade.

Educação é – só e só – tema INTRAPESSOAL e escola tende – sempre – à COLETIVIZAÇÃO, mui particularmente. Mas, não apenas em nações que adotaram o tal do “socioconstrutivismo”, cujos frutos bons, se alguém conhecer, por favor, avise a este articulista.

A própria etimologia dá as pegadas frescas e fundas para nossos acertos, já que “educar” vem da raiz latina exducere, cujas semânticas respectivas são ex (para fora) + ducere (conduzir, levar). Ou seja, já os antigos medievais sabiam que o processo de educação é de EXTRAÇÃO, precisamente de extração dos potenciais da alma humana, muito VARIÁVEIS, alma a alma, e com extensão ao infinito. Neste ponto, vale lembrar Goethe, que já advertia: “nem todos os caminhos são para todos os caminhantes” e que “a alma humana é como a água: ela vem do Céu e volta para o Céu”.

Se entre a alma humana e o mundo há uma porta, o educador há de, nesta última, bater e instigar ao educando a abrir, tal que só ele pode abri-la. A partir dos conteúdos, que especificamente saírem, que vá o educador instigar mais e mais, limitado necessariamente à VONTADE do dono da chave, o qual tem a prerrogativa absoluta para fechar a porta.

Fica evidente, desta forma, que qualquer ação que tenha por meta conteúdos objetivos externos a priori, niveladores de CONFORMIDADE social, não podem se encaixar sob o conceito de EDUCAÇÃO.

Voltemos para o exemplo da porta. Suponha agora que o dono da chave não a abra, ou ao menos não a abra de bom grado, e que, a seu turno, aquele que bate arrombe a porta ou, por qualquer outro meio, ingresse a fórceps. O nome que se dá a este último, em qualquer idioma, é INTRUSO, como o que “vem de fora para dentro”.

É bem fácil ver que são familiares e consanguíneos os termos e conceitos de INTRUSO, INSTRUTOR e INSTRUÇÃO.

É isso e exatamente isso que escola faz ou deveria fazer: INSTRUIR, de forma que pega conteúdos externos, eleitos em meta de nivelação social, e põe-los na superfície alma (meio invadida) do INSTRUINDO, sem nada escavar ou extrair. Ou seja, educação e instrução têm vetores opostos entre si. Uma de dentro para fora e com fronteira no céu e a outra de fora para dentro e com fronteira no “objeto estranho”.

Haveria mais fidedignidade vocabular se o correntemente, nominado Ministério da Educação, voltasse ao seu nome de outrora de Ministério da Instrução, deixando claros os LIMITES da atividade exercida e controlada sob sua batuta.

É bastante evidente que, a potência luminosa de quem SÓ SE INSTRUI, alcança luz de vagalume em comparação à potência luminosa de quem “também” SE EDUCA, já que pode estrelar no sentido mais vivaz do termo. É necessário, cumulativamente, às pessoas se INSTRUIREM e se EDUCAREM. É pretensão de SOBERBA querer ser educado sem, dentro de limites, ser instruído, tal como é soberbo pretender alcançar o céu sem passar pelo mundo dos homens.

Não deveria, pois, causar escândalo “as escolas que não educam”, pois não é seu mister mesmo. O escândalo se inicia com a “escola fazer confundir seu papel de instrução como se educação fosse”, levando tantos e tantos instruídos incautos, mais seus familiares e a sociedade em geral, a sequer “cogitar” sobre a atividade da educação no sentido próprio do termo.

O ápice do escândalo, contudo, reside nas “ESCOLAS QUE SEQUER INSTRUEM”, tal como é o caso das escolas brasileiras, que sequer têm competência para meramente INTROJETAR conteúdos externos padronizados como tijolos para paredes.

Isso sim é escandaloso, pouco percebido só porque é mais frequente entre nós a patologia que a saúde.

Saber discernir com alto rigor, ler sua própria consciência, decidir vocação, fortalecer-se em virtudes, deliberar sobre moral, formular estratégias de vida e etc., é atividade de EDUCAÇÃO e, pois, reservada aos que vão ousar abrir a porta a partir de dentro, elevando sua HUMANIDADE.

Contudo, ler textos básicos, escrever ao menos um bilhete com dois parágrafos, ter fala com mínimo de cadência ordenada, captar disposições espaciais simples, dominar as 4 operações da aritmética, porcentagem e regra de 3, são coisas notoriamente de INSTRUÇÃO. Hão mesmo de ser colocadas, à fórceps, se necessário, nas almas dos instruídos, sem que a HUMANIDADE deles esteja comprometida e, cujos efeitos nefastos egoísticos e altruísticos, são evidentes.

Não é porque é CRUEL essa DES-HUMANIDADE que ela não é o caso, pois o é. Quem nunca viu advogados desprovidos de instrução primária é porque certamente não atua entre eles, só por isso. O que vale nesse particular aos advogados, vale a administradores, arquitetos, profissionais da saúde, a universitários em geral e descendo a extratos mais simples.

Todas as pessoas são, inclusive, juridicamente obrigadas a ir para a escola, mas só 7% delas assimilam o conteúdo meramente INSTRUTIVO de matemática e 8% assimilam o conteúdo meramente INSTRUTIVO de português.

A afirmação, pois, de que a ESCOLA NÃO (OU SEQUER) INSTRUI, já é um SALTO na compreensão da MISÉRIA em que vivemos com contornos fortes de DES-HUMANIDADE e sem vistas de mera amenização da patologia endêmica.


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7 comentários

  1. Raimunda Campos disse:

    Bravíssimo! Belo texto.

  2. Ana Maria Desidério disse:

    Excelente !

  3. Alessandro Mariano disse:

    Excelente, como sempre !

    • André Muller disse:

      Professor, acabei de ver a aula 1 do trivium e ler esse texto, então fiquei com uma dúvida. Sempre entendi o nosso socio construtivismo como uma continuação do método jesuítico de ensino para educar os indígenas, no qual eles associavam a prática com a teoria, a imitação e o aprendizado por repetição, muito mais do que exaustivas aulas teórica cujas palavras fugiriam com o vento, sem uma base sensorial de fixação. Estou me referindo ao socioconstrutivimo do Anísio Teixeira e da escola parque por exemplo. E também associo isso com a própria prática medieval de construção das culturas a partir da coletividade até formar os Estados nações que temos hoje na Europa. Não seria então o sócio construtivismo herdeiro dessa tradição educacional tão bem sucedida e formadora de identidades nacionais?

      • Prezado, não sei te responder em termos precisos tal como a pergunta é formulada. Sei te dizer que muitos entendem que a Ratio Studiorum, método Jesuítico, que sucedeu o Trivium foi a ponta do novelo que veio dar no socioconstrutivismo.
        Dou uma “opinião” livre de que tal me soa EXAGERO, ainda que algum eventual vínculo entre a padronização da Ratio Studiorum e o que se seguiu possa ser o caso.
        Só a questão da COSMOVISÃO, por exemplo, espanca uma possibilidade de progressão razoável entre a proposta dos Jesuítas (a Graça de Deus) e o que vemos correntemente (ética cidadã).
        No mais, muito do que se chama por SOCIOCONSTRUTIVISMO hoje se pauta na alfabetização global-sintética, ao passo que os Jesuítas eram fônicos-analíticos.
        Tudo o que eu “achei que achava” sobre os Jesuítas caiu por terra para mim há poucos meses quando visitei as Reduções no Paraguai, Argentina e Brasil. Eles foram impressionantes e há traços visíveis do que falas de construção da cultura, mas não tenho cabedal afinado para “DISCERNIR” precisamente sobre o tema.
        Abraço
        Vicente

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