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Autor: Vicente do Prado Tolezano
04/06/2019

A dita crise brasileira é crise essencial e é CRISE DE SANTIDADE.

Instabilidade institucional, economia bipolar, moral relativista, estética do feio, barbarismo linguístico, orfandade generalizada, personalidades superficiais, etc … entre tantas miríades de mazelas não podem, contudo, ser propriamente, em si, problemas, mas, acuradamente, são sintomas.

A rigor, nem o vício e nem a virtude são o SER propriamente, mas os efeitos que decorrem de um ser fraco ou forte. Adágio muito antigo e muito certo diz que: “o agir segue o ser e não o inverso!”.

Separar causas de efeitos é que suporta a concepção de “caráter” e cujo espeque último é a doutrina da substância do já vetusta e sempre atual Aristóteles.

Este país é efusivamente simpático e mui majoritariamente canalha. Nosso maior dramaturgo, Nelson Rodrigues, era taxativo: “o brasileiro, quando não é canalha na véspera, é canalha no dia seguinte”.

Os comumente “ditos” problemas brasileiros, expostos acima, são materiais mundanos e, como também exposto, são acuradamente “efeitos”, mas de POBREZA DE ESPÍRITO.

Uma subversão de sanidade muito disseminada no Brasil e que o filósofo Olavo de Carvalho amiúde denuncia é a proclamação de busca de riqueza material para depois, pretensamente, se buscar o cultivo do espírito, seja refinamento intelectual ou caritativo. É auto engano consentido, espécie do gênero insinceridade, na mais branda das hipóteses.

A pessoa sã (amorosa) assimila tudo o que vive (característica intelectiva de atenção) e sintetiza tudo o que vive (caridade por múltiplas expressões/distribuições de cuidado) sempre e sempre, pouco importando o estado material em que esteja.

O movimento de assimilar e sintetizar se chama “transformação”, “consumação” ou “subida”. Seu paradigma é o da abundância. Se há mais bocas para comer, há de se produzir mais para que todos comam.

Os que não assimilam ou que não sintetizam – os canalhas – praticam movimento de “deformação”, “consumo” ou “descida”. Seu paradigma é o da escassez. Se há mais bocas para comer, há de se acumular comida para garantir-se.

A vontade lucidamente deliberada de subir e colocada no centro de sentidos e projeto integral da personalidade é a vontade de ser SANTO, coisa rara entre nós.

O santo pode entender o canalha, mas a recíproca é falsa.

Santo é o que “vence o mundo” e por renúncia deliberada a ele.

Não confundir “renúncia” com “escapismo”, o qual é apenas uma capitulação. Renúncia a algo é próprio de que tem a condição de ter o algo e o renuncia. Via de regra, o escapista é apenas um canalha travestido de vítima. Santo pode ser vítima de muitas coisas em termos objetivos, mas nunca assume a condição subjetiva de vítima na centralidade da personalidade.

Canalha é o que quer “ganhar do mundo” e num sentido de ter posse sobre ao menos alguma parte dele.

A operação do canalha se dá pelo EGO, projeção de personagem tão mutável quanto as cores de pele do camaleão. A operação do santo se dá justamente pela dissipação do EGO, pela busca de indiferença por conta dos estados circunstanciais.

O senso de santidade integra as grandes tradições religiosas. Na tradição Católica, o Santo passa pela “porta estreita”, sobe e está em comunhão com Deus. O canalha, por sua vez, é convidado, mas não tem tempo.

A teologia pagã ou esforços gnósticos também capturaram o senso de santidade.

Por exemplo, Platão já dividia o homem em 3 grandes níveis existenciais, de besta, de leão e de ave, este último em condições de sublimar como os santos. O homem-leão não participa do amor, mas da política por servilismo, bajulação ou força. Sua tendência é cair à condição de besta.

Aristóteles, por sua vez, concebeu um sistema de explicações morais de virtudes (força) e vícios (fraquezas) entrosado com uma escalaridade valorativa dos bens (o fim/motivação das ações): pura passionalidade, bens materiais propriamente, bens de reputação e bens de contemplação, estes últimos próprios de santos.

O Estagirita já assentava também que o máximo desta vida, por sua vez, seria conseguir antecipar os efeitos da próxima, deixando inequívoca sua compreensão da “transcendência” como ideal. Santo é o que transcende por desapego!

Quantas pessoas o leitor, brasileiro, conhece a seu redor que têm o objetivo de santidade?

Seguramente, poucas ou nenhuma, o que seria válido a pessoas de quaisquer nacionalidades, mas o que o artigo ousa propor é que a crise de santidade brasileira é situação extrema.

Qualquer não dessensibilizado sabe afirmar que o nosso desperdício de valor é superlativo, incluindo a renúncia do valoroso pelo nihilista.

Há toda uma cultura apoiando “orgulho” em dizer que não rouba e não taxando de “vergonha” a mesquinharia, a sedução, a futilidade e demais formas de embrutecimento e para não falar de coisas piores.

O país é umbilicalmente ligado à Tradição Católica Romana, mas tem pouquíssimos Santos declarados pela Igreja de Roma.

A aterração material brasileira só será mitigada por santificação, jamais por outros giros materiais, ainda que isso soe bizzaro às gentes, afeiçoadas, em grande parte, a práticas religiosas com forte impregnação psicologista e não espiritual propriamente dita.

Correm por aqui também a tal da “teologia da prosperidade” e miríades de expressões de materialismo espiritual!

Precisamos falar de santidade e dos santos. Todos os dias e várias vezes ao dia. Usar seus exemplos como modelos. As demais mazelas, enfim, são efeitos da falta de santidade mesmo e nada mais!


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Um comentário

  1. Wellington Valletta disse:

    Interessantes colocações!..
    Ressalva:
    Olavo de Carvalho não é filósofo, senão astrólogo, com incursões deploráveis no campo da política, e tabagista suicida.

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