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Autor: Vicente do Prado Tolezano
05/09/2019.

O amor à Pátria é daquelas espécies ditas de “amor-natural” e, pois, de certa forma apenas um proto-amor (eis que amor, propriamente, é necessariamente sobrenatural).

É um recurso afetivo para uso extra-ninho, tal que a multidão de fora não seja, ao menos simbolicamente, geradora de estranheza. Algo como longa manus de afeição familiar.

Os derivativos da Pátria, tais como nacional, patrício, territorialidade, soberania, etc … são apetrechos para construção de egos-expandidos-coletivos.

Aliás, não poderia ser diferente, pois justamente EGO é a moeda circulante nas interrelações humanas e tal que sem ele estas seriam impossíveis, eis que cada humano veria o outro como um perigo iminente (ainda que, de fato, o seja!).

É exatamente o EGO expandido-coletivo de “nacional” um caldo comum de um mínimo multilateral e mútuo de projeções, retroprojeções, expectativas, etc … que suaviza o império do instinto primário de luta e fuga, cuja determinação é de fazer ver tudo como ameaça.

Por sua vez, não é porque seja necessário o ego-expandido-coletivo para, mais que a convivência humana, a própria sobrevivência individual (somos gregários!) que as suas dimensões meramente ILUSÓRIAS passam a ser reais.

Mesmo as pessoas muito virtuosas, independentes, intelectualmente argutas e que já alcançaram o patamar de personalidade amorosa (ou seja, as menos “egoístas”) não podem ser propriamente “realistas” com relação ao tema da Pátria. A rigor, são ex-desiludidas (no bom sentido do termo) para com ela.

Fica evidente, pois, que há de haver respeito, senão mesmo cultivo do senso de Pátria, mas dentro, também evidentemente, de limites moderados.

Pelo amor à Pátria, o melhor das potências humanas nunca emergirá, sendo que o reverso poderá bem ser o caso. Pátrias nascem para suavizar perigos vitais imediatos mediante deslocamento do senso desse perigo para alhures. Por isso, todas as Pátrias se associam e evocam o bélico.

O melhor humano é o Amor Agápico, voltado ao Divino, a totalidades da humanidade, da criação, à existência ou ao ser como um todo e que é a régua única para viabilizar e mesmo aferir amores particulares (filia).

Dista da raridade fazer tomar a Pátria (porque coletiva, num sentido) como substituta da totalidade agápica, esquema aliás bastante manjado de mera idolatria, sob o qual, pois, moram vacuidade humana e mesmo ódio existencial.

Regra que não mente é de que todo ser vazio busca preenchimento, nem que seja um pseudo-preenchimento, como sói ser majoritamente. Noutras palavras, quem não ama, busca pseudo-amores, tal como a idolatria à Pátria.

Quem já não ouviu a tolice (para dizer pouco) de que pagar imposto é primaz em relação à caridade!

Afirmar confiança nos nacionais em preterição aos estrangeiros é outra tolice amiúde repetida como mantra interminável. Tomado em conta apenas o aspecto de nacional/estrangeiro, qualquer indivíduo é igualmente confiável ou abominável. A rigor, esse tipo de inércia é expressão sutil de orgulho.

Outro besteirol é o ativismo político, que muito dificilmente terá um mínimo de ressaibo de amor (nada importando a corrente política eleita), eis que se impregna de INTERESSE duns “sobre” outros, ao passo que amor é antagônico absoluto, já que há de ser desinteressado e “para” outros. Mais sutil ainda, mas ativismo político é expressão de orgulho fundo.

Correntemente, aliás, o ativismo político nem respeita a ilusão da Pátria, nos mínimos que ela pudesse prover de positivo. Quase todas os ativistas estão orientados em fidelidade a agendas “globais” (muito diferente de “universal”) e querem usar o aparato Pátria como uma “conversão coletiva” a um programa, ainda que hipocritamente à Pátria se declare amor.

Nacionalismos, xenofobia, fanatismos, pieguices diversas, etc … entre outros horrores de egos-orgulhosos-estúpidos são farinhas do mesmo saco ruim.

Pátria sempre é um ficto, nunca um percepto, mesmo que efeitos concretos dela derivem, o que, aliás, é comum às ideias. Propriamente, o Brasil não existe como substância. Existe um território, bem como um padrão difuso de idiossincrasias, algumas referências imaginárias associadas, etc … ao conceito de Brasil, o que, contudo, não lhe outorga estatuto ontológico para além de ente ficcional.

Nunca se peca em excesso relembrar o poeta Donne: “que nossos afetos não nos matem e nem morram”.

Em adequada (moderada!) proporção, que amemos a Pátria tanto quanto ela seja vis motivacional das personalidades de camadas infra 8 (as dos jovens ou dos imaturáveis) e preservemo-nos dos vícios que a desproporção gera.

Morrer pela Pátria? Jamais, senão para tolos mesmo. Que morramos por amor em prol de alguém, mas a Pátria em si, no limite, não é ninguém. Pode ser ofensivo a muitos, mas morrer pela Pátria “em si” não difere de morrer por um time de futebol – só sectarismo mesmo.

Qualquer ética meramente cidadã, por mais desenvolvida que possa ser, não deixa de ser grão de areia perto da montanha amorosa, que é sempre APÁTRIDA.


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